sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A reciprocidade do espelho

É no lodo, quando se vão às tempestades e o lago se acalma, que desabrocha a flor de lótus. Sem contaminar-se com o “fétido”, ela apresenta toda a sua pureza e sublimidade.

Um dos principais entraves na prática espiritual consiste em não tomarmos o “ambiente” como o professor que sempre nos orienta. 
Aquele que aguça os “olhos e ouvidos da mente” consegue captar tudo, ouvir e apreender, mas aquele que debate-se em si, e coloca- se  no papel de vítima não consegue sair das lições primárias da vida.
O fato é que o ambiente é o nosso grande mestre e também o maior aliado na prática espiritual que exerce a função de um grande espelho no qual podemos ver refletida todas as nossas atitudes mentais.
A respeito do espelho a Seicho-No-Ie nos ensina, no livro Namoro Casamento e Maternidade no capitulo Sobre a Formação do Lar e do Destino, que no cotidiano vemos a nossa vida refletida no outro através desta experiência que é a “reciprocidade do espelho”.
Cabe aqui compreender que essa experiência não tem por função fazer com que o homem torne-se carrasco de si, que a se ver no outro pense apenas em quanta maldade existe oculta em seu interior.
Muito pelo contrário o objetivo desta função é justamente o convite para uma reflexão profunda e uma realística mudança de atitude.
Sem compreender a função exata da “reciprocidade do espelho” os homens vivem se auto definindo, carrascos, heróis, invencíveis, e por aí vai..., as vezes  de um modo até simplório. Muitos destes rótulos não chegam a ser inadequados, mas podem ser usados de maneira perniciosa e mesmo prejudiciais.
O ato de rotular-se pode ser um impedimento específico ao crescimento, por exemplo.
É cômodo usar o rótulo como uma justificativa para permanecer o mesmo. Soren Kierkegaard escreveu: "Desde que você me rotule, está me negando”, ilustrando muito bem que o rótulo não constitui o “eu”.
Na psicologia multifocal (Cury 2008) encontramos que todos os sentimentos autodestruidores  do tipo "eu sou" são o resultado do uso de quatro sentenças neuróticas:
1. "Eu sou assim." 2. "Sempre fui assim." 3. "Não posso evitar isso." 4. "Esta é a minha natureza."
E cada vez que você usa uma dessas quatro sentenças, está realmente dizendo: “É verdade, e pretendo continuar sendo do jeito que sempre fui." Esta mente  é o retrato de um auto abandono.
Agora quando e como foi que assumimos estas características?
Os primeiros tipos de rótulos, na nossa história costumam vir de outras pessoas. Foram pregados quando éramos crianças e os carregamos até hoje. Alguém disse e alguém acreditou.
Os outros rótulos são resultados das escolhas, para se proteger da obrigação de cumprir tarefas desconfortáveis ou difíceis.
A primeira categoria é, sem comparação, a que prevalece mais,  é a mais aceitável, claro, sempre alguém tem culpa. Mas é a segunda que nos chama mais atenção, por ser o resultado de uma escolha pessoal.
Pela experiência da reciprocidade do espelho, o certo seria que ao ver os outros pudéssemos optar por melhorias em nosso modo de viver, nos presenteando com refinamentos no comportamento, alterando o modo como nos colocamos na vida.
As praticas espirituais são grandes aliadas, pois realizam a cura interior.

Agora, quando eu não enxergo, estes rótulos?
E, quando são invisíveis aos meus sentidos?
Aqui é que realmente entra a pratica espiritual, e a consciência da reciprocidade do espelho. O ambiente apresenta-se como o  mestre, que nos mostra através dos exemplos do cotidiano, o que e onde, devemos trabalhar pra justamente, libertar-se dos sofrimentos.
Essa é uma das lições, que confesso mais difícil, da minha pratica espiritual. Como adepto da Seicho-No-Ie no que diz respeito a minha cura interior, tenho, que ter capacidade de compreender que tudo e todos refletem aspectos ocultos da minha própria mente.
O encontro com o outro, na verdade passa a ser o encontro com o meu “eu” mais profundo expresso na figura do outro.
Entender claramente que tudo reflete um aspecto da minha mente, é realmente uma das lições mais profundas, e  são elas que podem oportunizar as melhorias na vida. Quando de fato compreendermos que tudo parte de nós, e a nós que retorna, não teremos mais que justificar.
A justificativa é um dos piores entraves da mente humana.

Vamos tomar, por exemplo: a raiva.
A raiva é um veneno interior ela não tem nenhum valor ou justificativa, veja bem, ainda que eu justifique que o outro está provocando em mim esse sentimento, o que temos que entender é: sou “eu” quem estou com raiva e sua única função é me causar danos.
Então sendo assim, se o outro, desperta em mim esse sentimento, ainda que eu tenha todos os motivos, o mestre ambiente está ensinando-me através desta experiência que eu não estou de fato em harmonia.
Qual seria a atitude de uma pessoa que está em harmonia?
Claramente perceber que: o que o outro faz, é só um problema dele. Na verdade não é o que ele faz, mas a resposta que eu dou ao que ele faz ou ao que está fazendo, é que vai fazer a diferença.
E se eu der só o que eu recebo, nós nunca vamos sair do lugar.
Alguém precisa assumir a responsabilidade de dar ao outro o que o outro não espera receber.
Essa atitude convida através deste ato desprendido de intenção, o outro à uma reflexão profunda. E ele até poderá com isso mudar a sua própria atitude, claro que será de sua livre escolha.
Outro aspecto da mente em harmonia consiste justamente em ter “compaixão” pela atitude do outro e orar pela sua felicidade.  Ao desejar que o outro seja feliz, ao orar pela sua felicidade você estará cobrindo a atitude do outro com amor. E incomodado com o amor que recebe preste atenção, sem ao menos saber de quem recebe, ele também poderá mudar a sua atitude.  Assim não existe mal algum.

O que aparenta ser um mal é apenas o reflexo do meu próprio pensamento.

Então nunca devo pensar em corrigir o outro, devo trabalhar exclusivamente o meu “eu” interior.
Vamos tomar outro exemplo: ao ver um filme triste, o que lhe vem à mente? Que sentimento esse filme desperta em você? Como ser humano é natural que tenhamos um sentimento de compaixão por todas as pessoas que sofrem, pois ainda que desconhecemos, originariamente todos somos um. A questão mais profunda a refletir é se passado o filme o meu coração continua sentindo essa profunda tristeza? Se essa tristeza me acompanha dias, na verdade ela não veio do filme, o filme apenas despertou a tristeza que estava na minha mente.

Complicado não? Afinal quem eu sou?
O conceito de carma é bastante difundido e já é de fácil aceitação, assim problemas, preocupações dores e tristezas são tipos de vibrações arquivadas no solo da nossa mente  constituindo nossos carmas. Claro que alegrias, amor, compaixão, garra, resiliência também são vibrações arquivadas solo da nossa mente e comumente os chamamos de carmas positivos.
Então eu sou o acúmulo das minhas vibrações, ou melhor, das minhas escolhas.
Em suma, precisamos dos outros para o nosso bem estar físico, emocional, social e espiritual. Sem eles, não somos nada. Nossa impressão de que somos autônomos é infundada. Claro, somos distintos, mas intimamente somos todos ligados.
O Professor Masaharu Taniguchi, nos ensina no livro que citei acima, que é por isso, que ao vermos o outro, brota em nós o desejo de conhecê-lo.
Somos separados, mas iguais, iguais, mas diferentes.
Contudo não podemos existir sem os outros, e eles, por sua vez, são afetados por tudo o que fazemos.
E é justamente o contato com o outro que nos dá oportunidade de conhecer quem somos.
Pois é o outro que revela o nosso interior, esta é a função do espelho, ver o nosso reflexo.
Sendo assim a ideia de que podemos garantir o nosso bem estar, ignorando o dos outros, ou até à custa deles, ou mesmo os usá-los como trampolim para o nosso êxito, é completamente irreal.
Refletindo as inúmeras facetas dos encontros e dos desencontros, devemos tomar a firme decisão de amar a todos os seres.

Como?
Se quisermos melhorar o nosso modo de viver, temos que abandonar os apegos, abandonar os julgamentos e doravante agradecer todas as oportunidades que nos fazem crescer, nos fazem compreender, nos fazem libertar dos sentimentos autodestruidores.
Essa mudança de concepção de vida acontece sempre com uma tomada de decisão.
Fundamentados nesta determinação, geramos um sentimento de apreço, uma sensação de que todos os seres são importantes e de que a felicidade de todos nos interessa.
Essa é a mente de amor, de modo que, sempre ao pensar em alguém, pensemos naturalmente: “Essa pessoa é importante, em minha vida, e a felicidade dela também é muito importante”. Dessa maneira nossa pratica espiritual buscará sempre levar a felicidade para o outro, uma vez que ela é importante e lembre-se importante, sobretudo pra a minha cura interior.
Uma outra razão para amar a todos, é que justamente esse é o melhor método pra solucionar todos os problemas.
Uma vez participei de um treinamento para os funcionários da Seicho-No-Ie e nossa consultora, Fátima Trindade, de um modo muito engraçado e peculiar nos transmitiu este ensinamento dentro de uma brincadeira, que consistia sempre em ao ver o outro mentalmente vibrarmos: “Eu gosto de você”.
Veja a inveja, por exemplo, é o estado mental que não consegue suportar a boa sorte alheia; mas se apreciarmos alguém, como o seu sucesso perturbaria a nossa mente?
Apreciando genuinamente todas as pessoas, agiremos sempre com amor, alegria e contentamento, e eles retribuirão a nossa bondade.
Seremos bem tratados, semearemos carmas positivos no solo da nossa mente, e não haverá fundamento para conflitos e disputas.  As pessoas virão gostar de nós, e nossos relacionamentos serão mais estáveis e satisfatórios. Esse tipo de mente nos liberta inclusive do “apego”.
É frequente nos apegarmos a uma pessoa pensando que ela vai nos ajudar a superar a nossa solidão, nos dar conforto ou mesmo o estímulo que necessitamos.
É preciso desejar que o outro seja em primeiro lugar feliz. Temos que aprender a dar.
O natural é o homem ouvir a mulher e cuidar dela! Não disputar com ela, falsos joguetes, agir com desprezíveis atitudes. Ela ao sentir-se cuidada e protegida, por sua vez, irá colocar  o homem como centro de sua vida.
São papeis, tudo o que a mulher mais deseja é ser compreendida e cuidada, quando ela apreender a dar, ou seja, quando ela passar a colocar o homem em sua função como centro ela será cuidada.
O homem sente-se pleno quando ele é o progenitor, quando ele é quem sabe, veja bem isso não significa que ele sabe, ele só precisa pensar que sabe, tenho que rir, enfim quando existe este respeito mútuo, e admiração, cada um em sua função, é possível caminhar sentindo cada vez mais apreço um pelo outro. Isso os torna um, os transforma em “magneto” da boa sorte, saúde e prosperidade. Não importando se a mulher, por exemplo, passa a ter um salário maior que o do homem, foi a harmonia de ambos que atraiu essa situação.
Assim, ao invés de nos apegarmos ao outro desejando satisfazer as nossas necessidades, vamos querer ajuda-los a satisfazerem seus desejos e anseios.
Apreciar os outros é a proteção suprema contra sofrimentos e problemas e no capacita a viver em harmonia.

Todos os nossos sofrimentos são resultados dos carmas negativos, e a fonte primária é o ego.
Porque temos um senso tão exagerado da nossa importância, frustramos os desejos das outras pessoas a fim de satisfazer os nossos.

Levados pelo ego, não pensamos em duas vezes para destruir a paz mental dos outros e causar-lhes angústias. Tais ações só servem para plantar sementes de sofrimentos futuros.
Se amarmos os outros genuinamente não teremos desejos de feri-lo e vamos parar de nos envolver em situações destruidoras e prejudiciais.
É vergonhoso esse modo de viver.
A principal razão porque não amamos todos os seres vivos, é que estamos tão preocupados conosco que sobra pouco espaço em nossa mente para gostar dos outros.

Se quisermos mudar a nossa mente, teremos que reduzir o interesse obsessivo que temos por nós mesmos.
Uma das principais funções do espelho é fazer justamente que eu reconheça as minhas falhas.

Também podemos usar a reciprocidade do espelho, para distinguir as atitudes do “ego” das atitudes genuínas do amor.
Sempre que eu estiver pensando, fazendo ou agindo de modo a prejudicar o outro, aí está o ego. Sempre que eu estiver dando o melhor pra o outro, pensando em sua felicidade aí está o amor.

Estes sentimentos podem ser facilmente confundidos, mas é fundamental, diferenciá-los, pois o amor só traz felicidade, ao passo que a mente do ego só nos trará sofrimento e nos prenderá cada vez mais no carma negativo.
No instante que notarmos o surgimento do apego, do ego, devemos ficar alertas – por mais prazeroso que pareça ser, seguir nosso ego, é como ouvi certa vez, estarei lambendo mel numa lamina de navalha, este prazer fatalmente trará sofrimentos.

Porque consideramos nosso falso eu, tão importante, exageramos nas nossas boas qualidades, cultivamos uma imagem inflada a nosso respeito, que quase tudo pode servir como base para nossa arrogância, tais como: nossos conhecimentos, aparências, posses, experiências e status. Somos capazes de gerar “orgulho”, até pelas coisas que deveríamos nos envergonhar como a nossa habilidade de ludibriar os outros. Passamos tanto tempo contemplando a nossas qualidades do “ego” que nos esquecemos das nossas falhas. 
Neste estágio, nossa mente está repleta de “ilusões” grosseiras, mas nós as ignoramos e até nos iludimos achando que não temos essas mentes repulsivas.

Isso é como varrer a sujeira pra debaixo do tapete e fingir que a nossa casa está limpa.
É tão doloroso admitir nossos defeitos, que inventamos todo tipo de desculpas e mentiras para conservar a imagem sublime que temos de nós mesmos.  A estratégia mais comum para não encarar as nossas falhas é culpar os outros.

Por exemplo, se temos uma relação difícil com uma pessoa, logo concluímos que a culpa é inteiramente dela e não conseguimos admitir que somos, pelo menos, parcialmente culpados.
Em vez de assumir a responsabilidade pelos nossos atos e nos esforçar para mudar de comportamento, discutimos com os outros, e insistimos que eles é que devem mudar.

Essa visão exagerada da nossa importância é que gera grandes conflitos.
O fato de estarmos desatentos as nossas falhas não impede que elas sejam notadas e apontadas pelos outros, e quando isso acontece, achamos que eles estão sendo injustos conosco.  Ao invés de encarar com franqueza o nosso comportamento para verificar se a critica tem fundamento, nossa mente do “ego” assume a defensiva e passa a retaliar os outros encontrando defeitos neles. Somos especialistas em apontar as falhas dos outros, e investimos uma grande energia mental, enumerando-as, analisando-as, e até meditando sobre elas.
Fixando-nos somente em suas falhas e limitações, ficamos irritados, ressentidos e, ao invés de apreciá-los, desejamos prejudica-los e desacreditá-los. Desta forma pequenas desavenças se arrastam por meses, anos vidas e reencarnações sucessivas.

Na reciprocidade do espelho, devemos assumir a atitude nobre de buscar as qualidades do outro, elogiá-las e trabalharmos para o seu florescer.
No combate as nossas mazelas, vamos até o fim, as praticas espirituais, processam em si a purificação suprema, e nossa atitude de sempre elogiar e agradecer a tudo nos coloca em harmonia com o universo.

Aprendendo a amar,
buscando esse modo de viver.  
Ariovaldo Adriano Ribeiro

De  uma das muitas igrejas de minha avó:
Vaso Novo
Eu quero ser Senhor amado,
Como um vaso nas mãos do oleiro
Quebre a minha vida e faça de novo
Eu quero ser, eu quero ser, um vaso novo
Como tu queres, Senhor amado
Tu és o oleiro, e eu o vaso
Quebra a minha vida e faça de novo
Eu quero ser, eu quero ser, um vaso novo
Hoje é tempo de louvar a Deus
Em nós agora habita o seu espírito
Então é só cantar, e a Cristo exaltar
E a sua glória encherá este lugar
Vem louvar, vem louvar
No meio dos louvores Deus habita
É seu prazer cumprir o que nos diz
Então é só cantar, e a Cristo exaltar
E sua glória encherá este lugar
Vem louvar, vem louvar.
Eu te louvarei senhor
De todo o meu coração - bis
Na presença dos anjos a ti cantarei (bis)
Louvores
Eu te exaltarei Senhor
De todo o meu coração bis
Na presença dos anjos a ti cantarei louvores
Fotos : by Ariovaldo Ribeiro 

5 comentários:

  1. Parabéns, Ariovaldo!

    Este seu texto me levou a uma grande reflexão sobre o que temos transmitido às pessoas.

    Vejo que aquilo que poderia ser uma briga, torna-se um momento de colocarmos em prática os ensinamentos da SNI. É no dia de hoje que temos que agir desta forma e não esperar pelo amanhã para consertar.

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  2. Maravilhoso! Muito obrigado.

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  3. Adorei...muito bom, nos faz refletir.....

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